Laços e Causos

GRATIDÃO À MINHA SAUDADE – HOMENAGEM À OSNI FANINI DA SILVA

Em fevereiro de 2010, escrevi um causo de nome “Saudade de um Boiadeiro”, em homenagem ao meu pai, que havia falecido em 2006, mas até então eu não tinha conseguido escrever sobre ele.

Contei um pouco de sua vida simples, de infância no interior até sua posse como presidente do Tribunal de Contas. Falei da música preferida dele, “Boiadeiro”, que foi cantada inúmeras vezes pelo Coral de Contas - grupo de funcionários do Tribunal que se reunia e ensaiava para cantar nos eventos daquele órgão - , e que quando cantavam esta música olhavam na direção do meu pai, que sempre agradecia a deferência.

Entre este servidores, um colega poeta de nome Osni, que, passados os anos, me enviou um email (em 2010 ainda não tinha whatsapp) agradecendo sensibilizado por eu ter lembrado do Coral de Contas no causo “Saudade de um Boiadeiro”.

Osni Fanini da Silva (Foto: arquivo pessoal)

Neste mês, passados mais de 15 anos, encontrei este email , e pude lembrar do Coral de Contas, com as vozes embargadas quando cantaram pela última vez a música “Boiadeiro”, olhando para o chapéu preto colocado no joelho de meu pai no dia de seu velório.

Publico este email com a autorização da querida Shirley, esposa do saudoso Osni, que, como poeta, culto e sensível que foi, inicia o email com um cordél de Patativa do Assaré.

Hoje nas terra do sul, longe do torrão natal

Quando eu vejo em minha frente uma boiada passar,

As águas correm dos olhos, começo logo a chorar

Lembro a minha Vaca Estrela e o meu lindo Boi Fubá

Com saudade do Nordeste, dá vontade de aboiar...

Ê ê ê ê la a a a a ê ê ê ê Vaca Estrela,

ô ô ô ô Boi Fubá.

Querida Claudiane,

Fiquei deveras emocionado com seu artigo, na coluna “Laços & Causos” , do Jornal Cavalgadas e Cavalos, edição nº 28, de fevereiro de 2010.

Reviver águas passadas pode, sim, mover moinhos... Prosear sobre causos do saudoso Conselheiro Quiélse faz de nossas reminiscências ouro lapidado, jóia rara.

Você passou mel em nosso boca ao citar o CORAL DE CONTAS como ativo participante em momentos de felicidade e de dor, nos quais o Velho Boiadeiro foi o principal ator. Em sua posse, na condição de Presidente do Tribunal de Contas, cantamos “Boiadeiro” (composição de Klécius Caldas e Armando Cavalcanti), com ele fazendo duo com o Coral. Lágrimas de emoção e alegria rolaram furtivamente, naquele dia, em sua face. Lembro bem... Afinal, ele gostava de cantar. Dizem que quem gosta de cantar e ama cavalos, só pode ser gente boa!!!. É verdade...

Aliás, ele também era um baita chorão!... Recordo que certo dia, ao sair do Tribunal, avistei-o papeando com os matutos que faziam a vigia do Tribunal. Já era tarde e ele estava sentado na mesa da recepção, trocando confidências, naquela linguagem simplória e campesina própria dele, com aqueles humildes servidores. Fui chegando, tentando entender a conversa, decifrar os termos e as expressões do estranho idioma que meu limitado ouvido urbano não estava acostumado a ouvir.

A história tratava-se de uma égua prenha que quase morreu, com seu potro, em uma improvisada baia-maternidade. A emoção com que era revestido o relato feito pelo Conselheiro Quiélse parecia indicar que as vidas envolvidas eram de seres humanos e não de um simples (para mim...) animal. Ele chorava ao lamentar o risco pelo qual passaram a égua e o potrinho. A partir daquela noite passei a ver os animais de outra maneira...

Lembro, também, de sua partida. Da legião de amigos e admiradores que lhe prestaram a derradeira homenagem. E o Coral, atendendo ao chamado de seus filhos, quase não conseguiu interpretar, pela última vez, a linda melodia imortalizada pelo Luiz Gonzaga. Nunca mais conseguimos cantar aquela bela música...

E vem você, agora, Claudiane, fazer esse afago em nosso ego de pseudos cantores, deixando esse belo registro de nossa modesta participação nesses devaneios da alma...

Obrigado, Claudiane. Vou reler, no próximo ensaio do Coral, para nossos velhos e novos seresteiros, o seu artigo. Sei que muitos vão se emocionar. E vão certamente entender melhor o que se passa no interior de um chapéu de boiadeiro...

Osni Carlos Fanini Silva